segunda-feira, 2 de fevereiro de 2009

O Espesso

A loucura que criou a crise
"Se alguém quer mesmo saber porque o sistema financeiro norte-americano deu o estouro que se sentiu em todo o mundo, então recomendo que leia "O Lobo de Wall Street", de Jordan Belfort. É uma história verídica, que dá conta da ganância e loucura de muitos que faziam girar triliões de dólares em Wall Street.
Belfort começou a trabalhar como corretor na LF Rothschild em 4 de Maio de 1987, aos 24 anos. Aprendeu rapidamente e em 1989 estava à frente da sua própria sociedade corretora, a Stratton Oakmont, e a caminho de ser multimilionário em menos de dez anos, tornando-se um ícone do empresariado norte-americano.
Na Stratton, "onde a sala de corretagem mais agressiva da América fazia a insanidade parecer perfeitamente normal", a maioria dos que lá trabalhavam tinha pouco mais de vinte anos, mas ganhava dinheiro como nunca, ao vender ferozmente, como pitbulls, acções entre quatro e dez dólares aos investidores mais prósperos da América, convencendo-os a especular com milhões. Um corretor de acções caloiro esperava ganhar 250 mil dólares no primeiro ano ("qualquer coisa a menos e ele era suspeito"), 500 mil no segundo ("ou era-se considerado fraco e sem valor") e no terceiro "era melhor estar-se a ganhar um milhão ou mais ou então era-se motivo de chacota". Por isso, à porta da Stratton havia intermediários tentando vender-lhes mansões, bancos assegurando financiamento, uma fila de vendedores oferecendo Porsches, Mercedes, Ferraris e Lamborghinis, chefs reservando lugares nos restaurantes mais caros, cambistas propondo bilhetes na primeira fila para eventos desportivos, espectáculos na Broadway ou shows de rock, e joalheiros, relojoeiros, alfaiates, amestradores de animais, etc.
A par disso, a droga circulava com fartura entre os corretores, a prostituição era praticada na própria sala de corretagem, nos elevadores, etc, e paga com cartões de crédito, mas também havia diversões absurdas, desde levar todo o tipo de animais de estimação para o escritório até jogos como atirar um anão de um corretor para outro, perdendo aquele que o deixava cair ao chão...
Jordan Belfort era, claro, a estrela daquilo que chamava "estilo de vida dos ricos e malucos", dirigindo um helicóptero Bell Jett de hélices duplas, calçando botas de pele de crocodilo de 2400 dólares, embalando o berço da filha de 60 mil dólares, vivendo numa mansão em Long Island, dormindo sob um lençol de seda de 12 mil dólares e, como ele diz, com uma quantidade de drogas correndo no seu sistema circulatório capaz de sedar a Guatemala inteira.
É óbvio que, por mais brilhante que Jordan fosse, mesmo na América não se chega a multimilionário em cinco anos sem que haja mais alguma coisa além de talento e sorte. Na verdade, Belfort colocava acções de empresas no mercado, cujo valor depois controlava usando a sala de corretagem. Se depois o dono da empresa não colaborasse, Belfort utilizava o seu poder para derrubar o preço das acções até chegarem aos centavos.
Colaborando, fazia subir o preço das acções através de vendas maciças. E em novas emissões garantia para si uma parte que comprava abaixo do preço do mercado, vendendo depois as acções com um lucro enorme. Além disso, utilizava testas-de-ferro para comprar mais acções do que a legislação lhe permitia.
Contudo, o dinheiro ganho ilegalmente tinha de ser colocado em local seguro, onde as autoridades americanas não começassem a fazer perguntas acerca da sua proveniência. E assim Belfort lá abriu uma conta num banco suíço, em nome de uma tia da sua mulher, bem como duas empresas fictícias nas Ilhas Virgens britânicas, onde não se paga impostos nem há regulamentos a seguir. Pelo meio, havia documentos falsificados e pessoas que serviam de correio para transportar o dinheiro para fora dos Estados Unidos.
Tudo foi correndo bem, até que morre a referida tia e um dos correios é detido e dá com a língua nos dentes. Belfort é obrigado a negociar com as autoridades o seu afastamento da presidência da Stratton e a empresa acaba por encerrar ao fim de oito anos. O seu passado profissional, contudo, continua a persegui-lo. E assim em 1999, Jordan Belfort, "O Lobo de Wall Street", é finalmente preso por fraude mobiliária, lavagem de dinheiro e outros crimes e acaba por cumprir uma pena de 22 meses numa prisão federal.
Foram pessoas como esta, brilhantes financeiramente mas ganaciosas, amorais e que sempre desprezaram as empresas produtivas, que durante duas décadas fizeram girar triliões em Wall Street, inventaram todo o tipo de veículos financeiros sem que ninguém soubesse exactamente que risco continham e alavancaram a economia mundial a um ponto que já nada tinha a ver com a economia real. O resultado é a devastadora crise em que caímos."

Nicolau Santos, Expresso online 2009.02.02


Com todo o respeito que possa merecer o Dr. Nicolau Santos, das duas uma: ou o Expresso está tão mal que tem que ir roubar leitores ao Correio da Manhã e ao 24 Horas, ou o Dr. Nicolau Santos está tão mal que tem que escrever sobre banalidades para ter leitores.
Este "Lobo de Wall Street" é um arrazoado de fait-divers daqueles que toda a gente sabe desde os anos oitenta, tão estafados que até já serviram de desculpa para filmes daqueles com Tom Cruise ou qualquer outra estrela de estatura semelhante (estatura, se calhar, é uma palavra dura para falar de Tom Cruise).
A única coisa nova em toda esta história (actividade estúpida e grosseira) é ficarmos a saber que, para certos "génios", atirar anões pode ser um desporto revigorante, embora se possa sempre pensar metafóricamente sobre o assunto. É que o que os "génios" da alta finança realmente andaram a fazer nos últimos anos foi precisamente atirar, neste caso areia, para os olhos de homens tão influentes e tão ouvidos pelo mundo, como Allan Greenspan ou outros de estatura (aqui estatura não fica mal) semelhante.
Há muito tempo que se sabia que a economia estava assente em castelos de cartas. Não se sabia é que quem o devia saber para nos descansar, não sabia ou fazia de conta que não sabia.
Neste momento é melhor guardar o dinheiro para quando o spread for tão grande como o juro, do que comprar livros que dizem que os responsáveis pelo estado em que isto anda se entretinham a atirar anões para enganar o tédio entre duas snifadelas.
Este tipo de literatura de cordel cria-nos predisposição para o homicídio, o que me parece pouco saudável. Pelo menos por agora!

1 comentário:

  1. Não iria tão longe, mas leva-nos a reflectir a insanidade em que se tornou certo jornalismo português.
    Sinceramente estou a marimbar-me para estes detalhes sórdidos saídos dum qualquer filme yuppie dos anos 80. A mim o que me interessa é a acção pedagógica que doravante se possa fazer para evitar que todos nós nos ajoelhemos economicamente com os malabarismos destes especuladores cocaínomanos que só serviram para FODER o sistema capitalista que a maior parte de nós entende ser o melhor dentro dos piores.

    Ave Caesar

    (Desculpe-me o vernáculo mas deve ser efeito do jameson que sorvi ao almoço)

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