Este ano é um ano tão bom como outro qualquer, mas em melhor, para se começar a olhar a História dos nossos últimos cem anos e para a explicar aos mais novos.
É verdade que há quinhentos e picos anos fomos donos do mundo, que construíamos os melhores barcos que o dinheiro pode comprar e que fomos, em grande parte, responsáveis pelo que hoje se chama globalização.
Mas isso ensina-se num ano lectivo e não existe o perigo de voltar para nos assombrar a vida ou para a tornar melhor.
Já o obscurantismo de praticamente metade do século vinte, a ditadura que ainda hoje nos faz olhar por cima do ombro, o nosso tão característico olhar de baixo para cima perante o poder, a resiliência conformada aos tropeções da vida e o fado, o destino colado ao coração, isso, sente-se a cada dia que passa, pode facilmente voltar e não sei se teremos forças para evitar que se instale.
Os novos têm que saber o que é não ter liberdade de expressão, têm que perceber que os bufos não eram apenas queixinhas. Têm que saber que antes de setenta e quatro também havia corrupção, que já havia fake news e que era perigosa qualquer tentativa de as corrigir, que a narrativa nos espezinhou ao ponto de acharmos que pobreza e humildade eram sinónimos e que decência era um atributo de quem cumpria os mandamentos e as obrigações.
A liberdade permite que tudo se possa experimentar e a democracia, por definição, não fecha portas - só a consciência, o conhecimento e o espírito crítico consegue destrinçar o que é daninho do que é são.
E sem conhecimento, o espírito crítico é pífio. Mais vale não ser.
O ensino da História contemporânea, sem artefactos nem ideologias, sem deve nem haver, limpa, factual, é uma obrigação da sociedade para com as novas gerações.
Estamos a falhar.
Se, de surpresa, se entregasse uma folha de papel a todos os jovens com, digamos, dezasseis anos, e lhe fosse pedido que enquadrassem num ensaio o contexto da ditadura e os acontecimentos de setenta e quatro, temo que o resultado fosse desastroso.
Quem não conhece o mal, convive com ele e deixa-o crescer.
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