segunda-feira, 13 de maio de 2024

do Retorno ao desconhecido

 






Conheci-os desterrados.
Acabados de chegar.
Traziam nos olhos os tons dos pores do sol na savana.
Os amarelos torrados e os sons do horizonte a perder de vista.
Ocres das terras e azuis que, de tão azuis, feriam os olhos cá por recordarem o que deixaram lá.
Eram diferentes.
Tinham mais mundo.
Muito mais mundo.
Sabiam que o horizonte não morre no mar ali diante dos nossos olhos.
Sabiam que o horizonte é infinito...
Como é infinito o que trouxeram apertado contra o peito e que tanta vez os deve ter feito verter lágrimas iguais às dos outros. Iguais às dos que salgaram o mar que Pessoa cantou.
E nós por cá.
Recentemente libertados.
Orfãos de vida e de sonho.
Tão orfãos que nem sabíamos o que tínhamos deixado de viver. 
Tão orfãos que nos faltava saber como lidar com a liberdade, 
E eles desterrados.
Com frio.
O frio que sentiam nos olhares dos que por cá insistiam em querer acreditar que os treze anos de mortandade que nos ceifaram uma geração se deveram a eles que fugiam - refugiados - empurrados para uma terra onde muitos nunca tinham entrado porque a outra, a dos pores do sol que nunca se esquecem é que é a terra deles.
Mil novecentos e setenta e cinco.
Um ano para lembrar.
E tentar acomodar. 
Enfiar o mundo no buraco de uma agulha.

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